quarta-feira, 27 de julho de 2011

ERA UMA VEZ UM TEMPO QUE NÃO VOLTA MAIS

Minhas avós têm cheiro de comidinha caseira, cheiro de doce, abraço com sensação de sabedoria, pele enrugadinha e macia que tem textura de história, de um tempo que eu não vivi, mas posso sentir. De um tempo puro que não volta mais.
Tenho minhas duas avós ainda vivas, lindas. Cada uma com sua peculiaridade que me fazem ter muito orgulho de ter nascido na família que nasci. As duas são da época onde a tolerância ainda existia, onde a família era um santuário e o respeito não se pedia, que dirá se exigia, apenas se tinha.
Sentadas na poltrona, sendo aninhada por elas tive vários conselhos que tento seguir, mas o mundo já não é mais o mesmo, as pessoas já não têm a mesma consideração. Mesmo assim, eu vou tentando pra ver se pelo menos perto da idade delas eu consigo chegar.
Uma delas passou dos seus 90 anos, ela já perdeu seus pais e a maioria dos seus irmãos, viu todos os seus amigos falecerem e seu álbum de retrato mais se assemelha a um museu, mas nunca a vi cabisbaixa, tristonha e nem contestando a vida, a Deus. Uma vez a questionei sobre seu passado, as pessoas que já se foram, sobre a saudade e ela me disse: se eu pensar na saudade, no que passou, eu não saio da cama. Não me interessa o que passou, se passou é porque já era a hora de passar, eu vivo o hoje e penso em quem está vivo hoje. Todos os dias, todas as noites só me lembro e rezo por quem está vivo. Quem se foi, se foi, cumpriu seu ciclo. É passado. Não gosto do passado, o passado não muda em nada minha vida.
Podem acreditar, é realmente assim que ela leva a vida. Sempre sorrindo, fazendo piada sobre tudo. Ela transforma qualquer conversa séria em uma bobagem só e é adepta a um palavrão de vez em quando só para trazer boas gargalhadas. Sempre leve, de bem com a vida. Enfrentou traições, enfrentou autoridade dos pais em uma época que mulher não opinava, tinha tudo para ser rabugenta, preconceituosa, amarga, não aceitar as condutas modernas e, no entanto, chega a ser mais atual que até eu mesma. Ela se adapta ao meio, se adéqua ao mundo, se transforma antes mesmo da evolução social. É assim que ela sobrevive a todas as experiências, é assim que ela marca nossa vida e faz sua história.
A outra é um pouco mais nova, mas com uma experiência de vida marcada por muita luta, decepção, mas ao mesmo tempo alegrias que nunca sentiremos. Alegrias simples, puras. Como a lembrança de se criar seis filhos, um marido rígido que não a deixava trabalhar, mas que nunca deixou faltar nada em casa. Da maneira caprichosa de se cuidar de uma casa, do seu lar que nada verdade é seu santuário, onde ela ajudou levantar as paredes e abriu mão de muitas coisas, inclusive de alimento, só para realizar o sonho de vê-la de pé.
Ambas viveram períodos de guerra, situações difíceis que nem conseguimos nos imaginar, mas passam a mesma lição de vida. Com ternura, simplicidade elas demonstram que tudo passa: momentos bons, ruins, pessoas... tudo tem seu tempo, mas para que valha realmente a pena é preciso recomeçar a cada dia, sem olhar pra trás, sem amarras e sem amarguras. Elas deixaram em nós bem mais que receitas de bolo, deixaram um legado, um manual de vida.

Fotos retiradas do google

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